Estamos sentados, você e eu. O sofá é de couro, marrom, cada um em uma ponta, apoiados nos braços. Na TV mais um seriado americano de que somos fãs, assistido sempre no mesmo dia e mesma hora da semana. Calados, atentos. No intervalo você me olha como quem diz: e ai? - e eu te lanço um olhar de escanteio e me volto para TV. Nada mais importa nesses 5 minutos, o silêncio preenchendo todo o espaço vazio. Eu e você, apenas. Termina a sessão, um se levanta, vai ao banheiro, o outro a cozinha. Voltamos, é a hora de um filme, faroeste, talvez, ou um desses filmes ao qual precisamos assistir novamente e novamente para chegarmos a uma opinião no mínimo razoável. Hora de dormir. Às vezes estamos no mesmo quarto, colados corpo no corpo, suor e mente, ás vezes estamos cada um em um canto dessa enorme casa, dormindo como quem não quer mais ser acordado. Eu e você, assim. As más línguas dizem que somos estranhos nessa relação, mas nos conhecemos até demais. Cada olhar, cada suspiro, cada desprezo. Tudo é relevado, calculado, sentenciado conscientemente, e depois, guardado. Para quê expor o que sabemos? Relacionamentos a dois têm dessas coisas. Cada canto um conto. No fim desse conto, basta a compreensão, o respeito. Nos lidamos bem, nós sabemos. Eu e você, sempre assim. Acomodados, habituados, requisitados, invejamos um ao outro. O que um têm peca na diferença, acrescenta-se o desejo. Eu e você, mutuamente. Sorriso de canto de boca, é para poucos. Está mais fácil o desleixo, o descuido. Somos loucos, nós sabemos. Se nem eu entendo, como posso querer que os outros entendam? Eu e você, até quando?